quarta-feira, 21 de março de 2012

Obra mediúnica "GABRIEL" ( V PARTE)


(Esta é uma obra mediunica; ainda não foi revisada em erros de gramatica ou ortografia; porem compartilho a sua essencia com muito amor no nobre obrar de Irmãos Espirituais)

GABRIEL

V PARTE

Equipe Nosso Lar
medium maria
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                                 V Parte - No Hemisfério do Arrependimento


                     Repentinamente o desconhecido começou a recuperar a consciência, abriu os olhos meio confuso e percebendo aquela senhora e as duas crianças observando-o atentamente, indagou com dificuldade:
-         Onde estou? Está fazendo muito frio! Estamos todos molhados!
Carol ainda não estava certa de quem ele realmente era,  mas o amor intenso que existe em todas as mães, que desejam proteger os seus filhos, se expandia em seu coração, testemunhando cada palavra que ouvira de Sara , e apesar de suas imensas falhas e crimes, desejava auxilia-lo. Falou--lhe controlando a profunda emoção que sentia em seu interior:
-         Senhor, estamos no meio de uma tempestade; e os fortes ventos levaram o telhado de minha casa. Precisamos sair daqui e abrigar-nos em  lugar mais seguro. Consegues andar?
O desconhecido levantou-se, sentando-se na cama, ainda coberto pela manta umedecida . Sentia-se bem. O desconhecido não conseguia recordar-se de nada.
-         Para onde iremos senhora? Onde estão as minhas roupas? Preciso vestir-me!
Carol lembrou-se do traje que não tivera tempo de lavar, pegou-o pedindo-lhe que se vestisse breve; estariam-o aguardando do lado de fora.
O desconhecido prontamente se vestiu, saiu da pequena casa e acompanhou-as sob a  chuva  constantes e os ventos imensamente fortes.
Carol observou que o leito do rio avançara demasiadamente para perto de sua casa, e realmente não tardaria a leva-la. Sentiu-se entristecida," tanto tempo ali ficara em proteção." Sara disse-lhes:
-         Sejam rápidos e me acompanhem!
A noite descia agora veloz e as pesadas nuvens escuras faziam ainda maior escuridão. Andaram aproximadamente duas horas consecutivas até que Sara ofegante, disse-lhes eufórica:
-         É aqui que ficaremos!
Carol olhou incrédula para uma enorme abertura na face de um enorme rochedo.
-         Poderemos entrar. Meu pai diz que aqui ficaremos  aquecidos na nevasca!
Carol disse-lhe assustada:
-         Não temos fogo e deve estar escura; deve ter bichos!
Silvio disse que saberia voltar á casa para pegar a lenha mas Carol não o consentiu. O tempo piorou em demasia e o frio se fazia insuportável; impelidos por seus instintos entraram rapidamente, recolhendo-se na gruta imensamente escura mas confortavelmente quente.
Não conseguiam ver-se tamanha era a escuridão e impulsivamente deram-se as mãos. Sara falou-lhes então com a voz embargada de receio, que ecoou naquele vão mostrando-lhes que este era extenso.
-         Meu pai precisava ir, não está mais aqui!
Carol sentiu a mão de Sara  extremamente fria e tremula; ainda que também tivesse múltiplos receios, sabia que era necessário manter-se calma e passar-lhes segurança. Falou-lhes:
- Devemos tatear o solo e acomodar-nos; será uma longa noite!
Silvio balbuciou nervoso.
-         Nada vejo, sinto-me completamente cego nesta escuridão absoluta; deve ter cobras neste recinto fechado!
Carol desesperada omitiu seu próprio pânico para falar-lhe.
-         Também nada vejo Silvio, vamos sentar-nos todos juntos, Deus nos protegerá!
O desconhecido de mãos dadas com Sara e Silvio também sentou-se e indagou confuso:
-         Nada compreendo ; sinto-me confuso! Onde está o pai dessa criança que não vi em momento algum no trajeto até aqui? Com quem falava afinal? Diz que se foi mas parece-me que em momento algum esteve conosco!
Carol imensamente impressionada também com tudo, tentou tranqüilizar o desconhecido dizendo-lhe:
-         Senhor, precisamos ter paciência e sermos tolerantes uns com os outros, somente o tempo nos explicará inúmeros acontecimentos; o importante é que finalmente estamos abrigados, graças ao Bom Pai . Aqui está quente e podemos ouvir que o vento aumenta lá fora e consequentemente o frio.
Dizendo isto Carol lembrou-se que nada haviam comido naquele imenso dia. Procurando trazer tranqüilidade a todos e a si mesma, começou a cantar baixinho e todos silenciaram escutando-a. Havia se passado algum tempo quando Carol indagou ao desconhecido:
-         Como se chama o senhor?
O desconhecido tentava clarear os seus pensamentos. As imagens que lhe vinham á mente, clareando-o no recinto imensamente escuro, mostravam-no cavalgando imponente; mas repentinamente o cavalo assustara-se com algo e com um pinote o jogara no chão. Lembrava-se ainda que batera violentamente a cabeça no chão, mas levantara-se rapidamente percebendo a enorme cobra que assustara o cavalo. Montara agilmente se afastando dela...nada mais conseguia se lembrar. Disse-lhes:
-         Não sei como me chamo; não lembro quem sou!
O desconhecido contou-lhes então de tudo o que havia se lembrado e Carol também lhe explicou como chegara á sua casa desacordado e com muita febre.
-         Sinto que a cabeça me dói violentamente e passando a mão nesta, percebo enorme inchaço!
Carol e Silvio haviam o examinado, mas não tinham verificado-lhe a cabeça. Carol interrompeu o silencio.
-         Trazias um imenso arco, flechas , facões e uma pequena bolsa com algumas frutas silvestres; isto te faz lembrar de alguma coisa?
O desconhecido fez enorme pausa tentando recordar-se de algo mais, mas as cenas que lhe vinham á memória eram sempre as mesmas , da queda violenta que tivera em função da cobra que se atravessara no seu caminho.
-         Não senhora, somente as imagens da queda se repetem!
-         Com certeza lembrarás amanhã...precisamos tentar repousar um pouco!
Disse Carol a todos, sentindo-se mais calma e mais segura. Todos silenciaram e ainda que o medo da escuridão fosse imenso, escutando possíveis morcegos inquietos sobre suas cabeças e grunhidos de bichos no recinto, conseguiram repousar, exaustos pelo imenso cansaço.







                           A tempestade de neve cobria as muralhas do castelo de enorme veste esbranquiçada. Ventos ainda muito fortes invadiam o pátio interno e debatiam-se violentamente contra os vitrais ainda intactos. Os servos acatando instruções de Lorde Arthur haviam ocupado os imensos salões luxuosos do castelo e lá estavam aquecidos e protegidos da continua tempestade. Também os animais foram levados para áreas cobertas nas quais se apertavam, mas manter-se-iam vivos .
Ricardo fora para o pavilhão dos doentes e percebia que eles morriam gradativamente. Não havia um só um enfermo, que escapasse da morte. O medico ainda que se sentisse impotente sem poder lhes curar, animava-se porque mais ninguém tinha adoecido depois das fortes chuvas e ventos. Somente dez servos ainda se encontravam ali.  Ricardo extremamente benevolente e caridoso auxiliava-os continuamente em suas necessidades. Ainda que soubesse, que aqueles enfermos  não sobreviveriam, não deixava que lhes faltasse amparo, conforto e solidariedade.
Lana freqüentemente levava as refeições para Linia que se recusava a sair do seu aposento, enquanto o castelo fosse abrigo para impesteados e servos. Perguntava curiosa á sua serva:
-         O que faz meu irmão Arthur?
Lana contendo-se na imensa admiração que sentia por Arthur, respondia-lhe humilde:
-         O seu jovem irmão, ampara os servos consolando-os na perda de familiares ou amigos doentes; doa-lhes mantas para que se aqueçam no imenso frio que está fazendo; alimenta-os bem para se manterem fortes; distrai as crianças assustadas contando-lhes estórias divertidas... foram acesas as imensas lareiras nos salões e a claridade e a paz que nestes reina, é inexplicável...
Linia indignada pensava revoltada nas palavras de Lana, a respeito de seu irmão. "Trata os servos como irmãos e me despreza; ignora que lhe sou sangue!" Enfurecida ordenou que Lana saísse de seus aposentos e esta sentiu-se extremamente feliz ao abandonar aquele enorme recinto de frieza e poder retornar ao enorme calor humano que reinava no piso inferior.
Lorde Arthur caminhou na direção do pavilhão dos servos, onde estavam os doentes e encontrou Ricardo aquecendo-os e dando-lhes toda a assistência. Implorou-lhe num sussurro:
-         Ricardo preciso de teu auxilio, conversai um pouco comigo! Sinto-me só e frágil!
O medico caminhou na direção do nobre tão jovem ainda dizendo-lhe:
-         Olhai ao teu redor Lorde Arthur, não estás só; inúmeros amigos abrigas em teu lar; te terão fidelidade eterna!
Colocando-lhe a mão no ombro, carinhosamente como sempre o fazia continuou.
-         Não és frágil, és um cavaleiro forte e um guerreiro decidido! Serás um importante nobre para este povo! Inúmeros lordes possuem fortunas imensas, títulos importantes, porte elegante, raça pura, mas falta-lhes a essência!
Arthur olhava-o atento sentindo uma força revitalizante animá-lo.
-         Lhes falta a nobreza de caracter! A nobreza do respeito e do amor, para com todos aqueles que os auxiliam a arar, adubar e cultivar as suas terras, inúmeras vezes com o incessante suor de seus corpos e a dor  de suas mãos! Falta-lhes a nobreza da Fé!
O lorde comovido abraçou-o humildemente, deixando-se envolver por pranto triste. Falou com dificuldade.
-         Não tenho mais família...todos morreram!
Ricardo afastou-se firmemente e olhando-o fixamente, secou-lhe as lagrimas dizendo:
-         Olhai ao redor lorde Arthur e perceberás que uma enorme família te cerca; como podes dizer-me que não mais a possuis e que estás só... Toda a tua propriedade está sendo destruída pelas tempestades; haverá muito trabalho pela frente; muito solo a arar, adubar e plantar novamente. Precisarás tudo reconstruir! Poderias ser meu filho e humildemente digo-te, não olhes para o que perdestes em tua vida; tal qual as águas de um rio, a vida segue seu rumo; não te lamentes pelo que não terá mais retorno... Senhor Arthur; olhai para cada novo dia que o Nosso Pai te concede e vive-o em plenitude como se fosse o ultimo!
Novamente o lorde envergonhava-se de sua fraqueza. Secando as próprias lagrimas agradeceu ao medico com um sorriso cândido e caminhou á cozinha para ver como estavam as providencias para alimentar os duzentos servos que ali estavam alojados...compreendera nas palavras determinadas do medico que aquela lhe era agora a grande família.
Setenta e nove servos tinham morrido na terrível peste e com a morte de seu pai Lorde Orlando, chegara ao cruel numero de oitenta vitimas fatais da doença. A maior parte destes em fase adulta; pais e mães de famílias que deixavam os seus filhos órfãos e desamparados; tal qual ele o era agora!
Após verificar o andamento da imensa refeição Lorde Arthur, caminhou determinado ao aposento de Linia. Entrou sem cerimonias e após fechar a pesada porta, sentou-se tranqüilamente em seu leito. Linia que estava próxima a grande janela, olhou-o intrigada e ali manteve-se silenciosa. Arthur falou-lhe sereno.
-         A ultima vez que conversamos dei-te dez dias para que te afastasses de nosso pai e de nossa propriedade; passaram-se os dez dias! Tantas coisas imprevisíveis aconteceram nestes...
Arthur após uma breve pausa entristecido, continuou no que precisava dizer-lhe, olhando-a sempre fixamente.
-         Nosso pai faleceu, como único herdeiro de suas propriedades resolvi reconhecer-te como minha irmã! Agora sou o Lorde Arthur e não te deixarei ao desamparo e nem te excluirei do direito que possuis sendo uma nobre!
Linia perplexa com a extrema mudança de seu irmão, não conseguia conter-se e sorriu satisfeita. O lorde prosseguiu ignorando-lhe a satisfação.
- No entanto Linia, deverás assumir a tua identidade como filha da serva Amancia e do nobre Orlando...
A fisionomia da jovem transformara-se repentinamente, se tornando séria e contrariada.
-         Deverás reconhecer-te filha bastarda e fruto de uma relação promiscua; mas pelo que me foi narrada por meu pai, relação extremosa em afeto reciproco...
Arthur levantou-se e caminhando em sua direção continuou falando-lhe firme mas afetuosamente.
-         Deverás assumir quem és e como tal, a conseqüente responsabilidade da maternidade.
Arthur havia se aproximado o suficiente para olhar profundamente nos olhos de sua irmã. Percebia-lhe a contrariedade. Voltou novamente a sentar-se no leito.
-         Sara a tua filha, está te aguardando não muito distante daqui; Assim que terminarem as tempestades irei buscá-la...
O nobre parou para respirar profundamente e aproveitou para observar a juventude e a beleza física de Linia.
-         Estou ciente que és a viuva de Job; Um bom e humilde servo que fazia qualquer coisa para te ver feliz e que em extrema infelicidade imposta por ti, não resistiu, morrendo repentinamente com uma parada de seu coração...Deverás Linia assumir também a situação de viuva e se vieres a contrair matrimonio com alguém, este deverá estar ciente de teu anterior matrimonio e da filha que possuis...
Arthur novamente levantou-se e caminhou até á porta para sair, mas voltando-se finalizou.
-         Estas são as minhas condições para que permaneças neste castelo, usufruindo do luxo, da riqueza, do titulo de nobreza; terás tempo para decidir se o desejas! Quando terminarem as tempestades virei saber a tua resposta!
Arthur saiu então do aposento e sentia-se extremamente sereno e forte.




































                           Os dias passaram em inúmeras tempestades de neve, ocultos no recinto da enorme gruta. Silvio e o desconhecido passavam os dias a vasculhar o interior daquele recinto e por vezes saiam na neve para pegar alguma lenha ou providenciar algo para se alimentarem. Haviam descoberto no interior da gruta um córrego subterrâneo do qual tiravam água para beber.
Na claridade que lhes chegava dos dias, podiam analisar-se sujos. Sentiam-se  extremamente enfraquecidos em semblantes emagrecidos e abatidos; o alimento lhes era escasso e rigorosamente repartido entre todos.
.Mas as noites novamente chegavam-lhes imensamente escuras e ainda que conseguissem fazer uma pequena fogueira esta lhes iluminava breve tempo. A lenha era pouca e se fazia necessária a cozinhar por vezes os pequenos animais que conseguiam pegar. Tão logo esta se consumia, novamente ficavam completamente cegos ao que lhes acontecia ao redor.
O desconhecido não conseguia se lembrar de sua vida e auxiliava a todos continuamente extremamente solidário e tentando ser prestativo.
Naquela manhã Sara havia amanhecido imensamente febril e em movimentos involuntários convulsivos, delirava. Carol observou-a preocupada e não tardou a que percebesse grande inchaço  em seu tornozelo, mostrando que havia sido mordida por algum bicho. Percebeu ainda, na tonalidade arroxeada do ferimento que este a devia ter atacado aquela noite. Desesperou-se temendo a sua sobrevivência, pois desconheciam a peçonha que lhe fazia piorar a cada instante que passava.
O desconhecido demasiadamente apreensivo também, ao ver a meiga menina naquele estado enfermo, carregou-a nos braços delicadamente, tirando-a da gruta; e sendo acompanhado por Carol e Silvio que o observavam atentamente.
Estava ardendo em febre, deitou-a na neve para refrescar-lhe o corpo e passou o gelo levemente em sua face. Fazia-o subtilmente para não queimar-lhe a pele, mas somente refresca-la.
Depois cuidadosamente analisou-lhe o tornozelo e sentiu-se mais apreensivo em perceber que o inchaço e o tom arroxeado já se alastrava para a perna.
Sem conseguir compreender de que parte de sua vida vinha-lhe a experiência em medicar, sentia que sabia faze-lo!
Estava ciente de que o veneno se alastrava. Precisava rapidamente tira-lo! Procurou rapidamente na gruta uma pedra pequena e a afiou com extrema agilidade em outra pedra, fazendo-lhe uma face cortante. Carol observava-lhe o trabalho primoroso "tal qual devia confeccionar as flechas".
Próximo á menina novamente, o desconhecido fez-lhe um pequeno corte no tornozelo e sob os olhares assustados de Carol e Silvio, colocou-se  a sugar  o ferimento, e a cuspir continuamente aquele sangue venenoso.
Durante longo tempo, o desconhecido se concentrou incansavelmente nesta tarefa. Depois carregou a menina inconsciente de volta á gruta. Tirou o seu traje, ficando somente com a canga, e a cobriu carinhosamente com ele.
Olhou para Carol e pediu-lhe que colocasse gelo freqüentemente sobre o ferimento ainda arroxeado para que não mais sangrasse e auxiliaria a diminuir também o inchaço.
As crises convulsivas tinham cessado mas a febre ainda lhe era extremamente alta. Enquanto Carol auxiliava Sara, o desconhecido e Silvio saíram na neve a procurar mais lenha. Sabiam que não poderiam ficar novamente no escuro absoluto da gruta; o bicho que ainda lhes era incógnito, poderia voltar e o fogo o afastaria. Ainda que sentisse imenso frio, somente revestido da canga, o desconhecido ia e vinha da neve, trazendo inúmeros gravetos que eram empilhados na gruta por Silvio.
Já o dia findava quando o desconhecido finalmente conseguiu fazer uma fogueira e ali aqueceu o seu corpo completamente gelado. Após sentir-se melhor, colocou algumas raízes que colhera sob a neve, para cozinharem no fogo e ofereceu a Carol e Silvio, para que comessem.
A nobre senhora, olhou o desconhecido que amassava um pouco da raiz , entre os seus dedos e colocava o alimento delicadamente na boca de Sara ; ciente de que mesmo que a menina se mantivesse inconsciente, o engoliria com a salivação. Em sua mente Carol recordava-se dos inúmeros atos bárbaros e inconseqüentes, que Sara havia narrado da vida daquele homem; se realmente tivesse feito tanto mal, aquele desconhecido ali mostrava, que em sua essência mais profunda todo o ser humano possui a verdadeira fraternidade.
Concluída a tarefa de alimentar Sara, somente então o desconhecido alimentou-se, dizendo para Carol e Silvio que poderiam repousar tranqüilos, que ele ficaria de vigília para que o fogo não se apagasse; Carol e Silvio prontamente o fizeram exaustos pela demasiada fraqueza orgânica.
A noite já ia bem alta quando o desconhecido sempre vigilante, percebeu que a fogueira principiava em querer apagar-se e levantou-se a pegar alguns gravetos. Perplexo observou na pouca claridade existente, que uma enorme aranha negra e peluda, se aproximava do rosto de Carol, que dormia profundamente. Com uma mira impressionante e incrivelmente certeira, matou-a com uma pedra roliça que agilmente havia pegado no chão.
Carol despertou assustada com a pedra que resvalara somente um pouco em si, sem no entanto feri-la.
Olharam incrédulos para o grande bicho peçonhento e concluíram que ele deveria ter mordido Sara. Ela dormia serena.






















                  Numa bela manhã  o sol  surgiu mostrando sua plena imponência.  Após longos seis dias de tempestades destruidoras, os servos finalmente saiam sorridentes e eufóricos do castelo; dando graças pela vida que brilhava intensa. Somente um enfermo ainda sofria com a terrível peste, os demais tinham morrido naqueles intermináveis dias. Ninguém mais adoecera desde o inicio daquelas contínuas tempestades.
Lorde Arthur saiu também do castelo, respirando profundamente o ar ainda imensamente frio, mas sentindo-se bem com o frescor límpido.
Ricardo acompanhava-o  sentindo os raios solares como uma enorme benção que emanava de um sol grandioso.
-         Senhor lorde Arthur, demos graças ao Nosso Pai!
Dizendo isto o medico ajoelhou-se humildemente sobre a neve, reverenciando o Criador. Inúmeros servos repetiam o mesmo gesto de agradecimento pela vida e o nobre, vislumbrando aquela impressionante imagem de fé, extremamente emocionado, deixou-se cair também de joelhos em intima prece.
Passada a emoção, o lorde Arthur e Ricardo, cavalgaram para ver os estragos na propriedade. A neve ainda se espalhava grotescamente por todos os cantos; as plantações tinham sido inteiramente destruídas; as cercas dos pastos arrancadas; a moradia dos servos destelhada; as arvores frutíferas derrubadas; os imensos celeiros apresentavam a madeira contorcida violentamente pela fúria dos ventos; tudo teria que ser reconstruído!
Cavalgaram até o lago que ainda se mantinha uma enorme tina de gelo e subitamente lembraram-se de Gabriel; ao qual haviam esquecido naqueles dias.
Ricardo apeou da montaria e caminhou até á gruta sendo acompanhado pelo nobre. Estava deserta e sem sinais aparentes de que alguém ali houvesse se escondido nas tempestades. O medico mostrou ao jovem o nome de sua irmã que fora cravado na pedra; depois mostrou-lhe onde encontraria os arcos e flechas. Arthur encontrou-os ali ainda guardados. Decidiu  leva-los para o castelo e Ricardo auxiliou
Retornando ao castelo Arthur percebeu que os servos ainda aguardavam suas ordens. Pediu-lhes então que fossem consertar sua enorme moradia. E quando esta estivesse pronta deveriam consertar os pastos para nestes libertar os animais ainda presos no castelo. Depois era importante a construção dos celeiros e a organização dos pomares.
Prontamente os servos foram se dispersando seguindo as orientações de seu senhor. O lorde Arthur dissera-lhes ainda, que não designaria nenhum capataz; deixava-os livres a agir!
O jovem olhou Ricardo apreensivo.
-         Vamos imediatamente á casa de Carol!
Ambos novamente montaram e seguiram rumo á moradia de Carol. O jovem Arthur sentindo-se muito feliz, ia lhe explanando.
-         As trarei conosco para residirem no castelo; serás tu, meu bom Ricardo, condecorado com um titulo e uma parte de minhas terras; a partir de hoje não serás mais meu servo...serás o que sempre fostes, o meu nobre amigo e mentor!
Arthur sorridente prosseguiu.
-         Até que construas a tua moradia, residirás no castelo, no aposento que era de Anderson! Carol se alojará no aposento de minha doce mãe Joane, pois em verdade esta nobre senhora, sempre me foi uma verdadeira mãe! Sara se alojará num aposento ao lado do aposento de Linia...seremos todos uma só família!
Ricardo olhou-o humildemente agradecido e ambos prosseguiram cavalgada veloz e silenciosa. Arthur desejava rever Carol bem e Sara, a sua sobrinha, sempre esperta e astuta. Silvio as traria com conforto na carroça até o castelo.














































                              Após três horas de cavalgada difícil em função da neve, muito densa em determinados trechos, chegaram próximo ao rio.
Assombrados perceberam que apenas algumas paredes da casa haviam resistido ao impacto das águas. Num impulso Arthur gritou desesperado:
-         Sara...Carol...
Mas nenhuma resposta lhes veio. Um arrepio frio lhe percorreu o corpo juvenil "teriam sido mortas na tempestade"...a idéia lhe aterrorizava e olhando o semblante do medico percebeu que também isto tinha os mesmos receios.
Apearam da montaria e vasculharam as ruínas da residência; mas nada existia por debaixo da neve; tudo fora carregado pela água. Somente as duas paredes haviam resistido.
O nobre decidiu descer o leito do rio para verificar se encontrava algum vestígio ou sinal de vida. Enquanto o medico, rouco pela emoção, acompanhava-o gritando e chamando por seus nomes continuamente.
Nenhuma resposta se fazia ouvir. Perceberam alguns destroços de moveis da moradia que lhes deixou mais angustiados. Temiam falar as suas duvidas e incertezas. Caminhando mais um pouco decidiram voltar. Próximo ao cavalo Arthur abaixou-se exausto por caminhar na neve. Ricardo ainda repetia os nomes de Sara e Carol chamando-as continuamente.
A menina Sara, auxiliada por seu pai, havia caminhado em sentido contrario ao rio, mas ambos desconheciam isto persistindo em fazer as buscas próximo ao leito deste.
Não desistiriam enquanto o sol não se escondesse no horizonte.
Sara abriu os olhos repentinamente. Silvio e o desconhecido haviam saído para tentar caçar algum roedor que os alimentasse. Sentiam-se imensamente fracos e era  difícil caminhar na neve. Carol  ficara com a menina , que agora lhe  olhava suplicante:
-         Sara como te sentes? Estivestes muito doente!
A menina balbuciou com dificuldade:
-         Sai da gruta e grita!
Carol não compreendera, e Sara repetiu-lhe:
-         Precisas gritar, estão nos procurando!
 A nobre senhora não hesitou, rapidamente levantou-se e caminhou até á entrada da gruta; e gritou:
-         Estamos aqui!
A voz lhe saiu tremula e fraca, mas o vento a transportou até onde estavam lorde Arthur e Ricardo.
-         Escutastes  algo Ricardo?
-         Sim Lorde Arthur, mas não posso dizer-te de que direção foi proveniente.
Ambos puseram-se a gritar, mas Carol não os escutava. Carol entrou na gruta e Sara olhou-a angustiada:
-         Grita! Grita sem parar! Eles escutaram!
Novamente Carol saiu da gruta e Silvio e o desconhecido chegavam apressados:
-         O que foi senhora Carol?
 Indagou-lhe Silvio preocupado. Carol simplesmente disse-lhes :
-         Peço-lhes que gritem o mais alto que possam!
Os três  começaram então a gritar "estamos aqui" repetidamente. E o Lorde Arthur e Ricardo localizaram de onde vinham os gritos distantes.
Após árdua caminhada de três horas em imensa dificuldade; transpondo obstáculos derrubados pela tempestade e puxando seus cavalos; o lorde Arthur finalmente viu a nobre senhora extremamente magra e abatida por aqueles dias de penúria e sacrifícios. Correu ao seu encontro e abraçou-a afetuosamente.
-         Tive tanto medo de não mais vê-la Carol!
Carol deixou-se cair em pranto convulsivo , e assim ficaram alguns instantes.
Logo Ricardo também aproximava-se e percebeu Gabriel olhando-os incógnito.
-         Perdoai-me senhora, mas o que ele faz aqui?
 Também o Lorde olhou intrigado para Gabriel e extrema fúria lhe veio ao peito:
-         Desgraçado! Disse-lhe pegando a imensa espada que lhe estava na cintura.
Imediatamente Carol colocou-se na frente do desconhecido e acalmou os cavalheiros:
-         Salvou-nos a vida! De nada se recorda! Depois conversaremos sobre isto... a menina Sara ainda esta doente!
Escutando o apelo da senhora que lhes transmitia serenidade, Ricardo e o Lorde Arthur entraram na gruta e perceberam que a menina ainda ardia em febre.
-         O que aconteceu?
Indagou Ricardo apreensivo pensando que ela estava com a peste. Carol tranqüilizou-os:
-         Aquela aranha a mordeu no tornozelo!
Lorde Arthur observou a imensa aranha negra, extremamente peluda, dizendo:
-         Mas este bicho é mortal, sua peçonha mata um homem adulto em vinte quatro horas!
Carol contou-lhes como o desconhecido ficara horas extraindo a peçonha do corpo da menina.
-         Não temos tempo agora para conversas, começa a escurecer e precisamos retornar ao castelo. Perderam a carroça? Os cavalos?
Gabriel respondeu ao Lorde Arthur humildemente:
-         Caminhamos a procura-los hoje, e não os encontramos senhor; com certeza fugiram para se esconderem das tempestades.
Lorde Arthur olhou-o, intrigado com sua humildade, também Ricardo estava temeroso.
Ricardo então recomendou:
-         Poderemos levar  a senhora Carol e a menina Sara em nossos cavalos; amanha mandaremos buscar Silvio e este cavalheiro.
Lorde Arthur agradeceu o conselho, e colocaram Sara cuidadosamente na montaria do médico Ricardo;  Carol foi auxiliada também por Lorde Arthur a montar em seu cavalo. Despediu-se rapidamente de Silvio e do desconhecido e rumaram breves para o castelo.
No caminho, a nobre senhora contou emocionada ao Lorde, como o desconhecido surgira e como  os auxiliara naqueles inesquecíveis dias de fome e de frio.
Sara adormecera amparada pelo médico Ricardo que a tudo também escutava.  Carol enchendo-se de coragem, e controlando a imensa emoção que sentia; contou-lhes pausadamente, o que Sara lhe narrara a respeito dos bárbaros crimes de Gabriel;  também lhe revelara que este era  o seu filho!
Arthur parou repentinamente o seu cavalo  e observou-a completamente surpreso. Podia ver que as lagrimas lhe desciam nas faces silenciosas. Indagou-lhe:
-         Como Sara poderia saber de todos os crimes de Gabriel? Também não compreendo como este pode ser seu filho?
 Comovida, Carol pôs-se a narrar a sua estória;   como o seu pai lorde Orlando havia mandado mata-la  e como o velho Manco a havia salvo!
O Lorde Arthur sentindo enorme indignação pelas frias atitudes de seu falecido pai, também se emocionou. Não conseguindo nada dizer-lhe; a acariciou tentando conforta-la pelo imenso sofrimento de sua vida. Pediu-lhe perdão num silencio sincero em nome de sua família; jurando a si mesmo, conceder-lhe proteção e amor enquanto Carol vivesse! Pensativo na árdua vida daquela senhora, confuso com os inúmeros mistérios que envolviam Sara, e triste pelo caráter de seu nobre pai que desconhecia  em sua profunda admiração infantil, fazendo-o sempre herói; prosseguiu rumo ao castelo em trajeto que já estava escuro.
Ricardo a tudo ouvira silencioso e entristecido; sentia enorme admiração por Carol surgir-lhe intensa em sentimentos fortes.
Admirava-a profundamente, pelo sincero perdão que sentia e que demonstrara ao falar dos  que lhe tinham feito tanto mal; pela humildade que expressava serena e harmônica em cada gesto; pela imensa benevolência que irradiava em seus olhos; pela resignação á vida que lhe fora concedida e pela felicidade que sempre emanava num sorriso fraternal que amparava, consolava e transmitia muita paz a todos.

































                         Tarde da noite chegaram ao castelo e Carol disse humildemente preocupada, não desejando dar mais problemas a lorde Arthur.
-         Que falarás ao senhor teu pai?
 O Lorde Arthur disse-lhe sem comoção:
-         O Lorde Orlando faleceu na terrível peste que lhe contamos!
Silenciou amparando a nobre senhora para que apeasse da montaria. Considerava-a e amava-a como a uma mãe! Refletira no quanto ela sofrera, isolada durante tantos anos completamente excluída da convivência com o filho e com o seu povo. Respeitava-a ainda mais! Porem em sua jovialidade, não compreendia a sua tamanha resignação a tanto sofrimento... fora drasticamente arrancada de seu seio familiar ainda muito jovem; violentada física e emocionalmente por seu avô materno; assumira a maternidade nutrindo afetividade nos muitos meses de gestação; privada do muito amor a dar a seu filho; jogada num rio á morte como se nada fosse... como poderia ser tão serena e transmitir tanta paz.
O nobre auxiliou o médico a tirar também a menina Sara da montaria e este carregou-a carinhosamente no colo até o nobre salão do castelo. Alguns servos atendiam o pedido de lorde Arthur arrumando os aposentos designados para cada um enquanto outros se apressavam em concluir forte alimentação para todos.
Carol e Sara alimentaram-se famintas e depois foram repousar  em seus aposentos.
O Lorde pediu então a Ricardo que ficasse um pouco mais para conversarem e ambos foram para a biblioteca, onde poderiam ficar mais á vontade.
-         Preciso de teus conselhos Ricardo!
O médico olhou-o prestativo:
-         O que desejas Lorde Arthur?
Arthur colocou-se a andar meio nervoso e o médico percebeu-o inseguro.
- Ricardo, crês que Gabriel, realmente perdeu a memória?
O médico pensou um certo tempo e disse-lhe;
-         Por tudo o que Gabriel fez, as maneiras premeditadas como agiu... o uso das ervas para se fazer doente... creio que novamente finge para poder se aproximar do castelo e nos atacar em oportunidade propicia...
Respirou profundamente temeroso e continuou:
-         ... No entanto Arthur, julgo-o pelos acontecimentos passados, poderei estar errado!
O Lorde caminhou pensativo e sentando-se indagou-lhe hesitante:
-         Tens mais experiência de vida do que eu; o que farias com Gabriel?
Ricardo sem temor disse-lhe firmemente:
-         O prenderia na masmorra lorde Arthur, até estarmos plenamente certos de que não nos faria mal!
Arthur olhou-o agradecido e ambos foram repousar daqueles longos dias.










                         Silvio e Gabriel observaram felizes que o médico Ricardo e um servo se aproximavam para busca-los. Novamente o dia amanhecera em sol intenso e o gelo, durante a noite tinha reduzido enormemente, facilitando-lhes a cavalgada.
Traziam dois cavalos atrelados em suas montarias. Ricardo apeando disse-lhes;
-         Venham que o Lorde Arthur vos aguarda e não devemos demorar-nos!
Cavalgando num trote apressado e silenciosos, fizeram o trajeto de retorno ao castelo em brevidade.



                         O sol ainda não se erguera plenamente quando chegaram a propriedade. O médico Ricardo disse a Silvio que fosse rever seus familiares e depois deveria retornar a suas tarefas. O rapaz prontamente o atendeu, mas antes indagou-lhe como estava a menina Sara. O médico respondeu-lhe:
-         Amanheceu sem febre, mas permanecera de repouso por alguns dias, ficara boa Silvio!
O rapaz  então  despediu-se e afastou-se levando os cavalos. O médico então, olhou para  Gabriel e falou-lhe:
-         Venha comigo, o Lorde Arthur deseja falar-lhe!
Gabriel mostrando-se surpreso com tudo o que via, como se avistasse pela primeira vez, meneou a cabeça humildemente disposto a acompanha-lo.
Ricardo bateu levemente na porta e o Lorde Arthur autorizou-os a entrar. Estava sentado por detrás da grande mesa, ainda repleta de livros e manuscritos. Olhou Gabriel com vivacidade e falou-lhe com seriedade:
-         Senta-te!
O médico Ricardo caminhava para se retirar quando o Lorde pediu-lhe:
-         Ficai amigo Ricardo!
Pediu-lhe então amigavelmente que também se sentasse. Gabriel estava defronte a ambos e apresentava imensa serenidade. Ricardo estava disposto a analisar-lhe todas as reações. O Lorde iniciou indagando-lhe:
-         Dizes que esquecestes quem és?
-         Sim senhor Lorde; somente me recordo de uma queda!
-         Porque estavas armado de arcos e flechas?
-         Não me recordo não senhor Lorde!
-         Conhecestes alguma coisa em minha propriedade?
-         Não senhor Lorde, creio que nunca estive aqui antes!
-         Com esse traje julga ser um nobre?
-         Não posso afirma-lo senhor!
Gabriel era rápido e breve nas respostas, deixando o médico intrigado. Arthur falou-lhe:
-         Sei quem és! Te chamas Gabriel!
Gabriel escutou o seu nome com imensa surpresa! Sentia-se ansioso! Desejava ardentemente saber quem era! Precisava conhecer-se! O Lorde Arthur então deixando se envolver pela emoção, contou-lhe:
-         Teu sangue é nobre; és filho de meu avô materno; irmão bastardo de minha mãe Joane e consequentemente és meu tio...
O semblante de Gabriel mostrou-se surpreendido e o Lorde continuou:
-         ... Por opção de meu pai Lorde Orlando, desconhecias o parentesco e fostes criado como um mero servo; tutelado por um velho chamado Manco, era um curandeiro, um profundo conhecedor de ervas e com estas medicava e salvava muitas vidas; trabalhastes no celeiro cuidando dos cavalos até os teus vinte anos. Eras um excelente aprendiz da arte de curar de teu tutor e um servo exemplar... tudo  te tinhas,  para teres uma vida nobre!
Ricardo observou que Gabriel mostrava-se comovido.
-         ... No entanto desconhecendo os laços de sangue, que te uniam a esta família, apaixonaste-te por minha irmã Brigith e neste sentimento correspondido, a seduziste. Gerastes um filho que também desconhecia mas que crescia no ventre de tua sobrinha que tinha apenas quinze anos...
O Lorde Arthur, respirou profundamente, tentando conter a emoção e manter-se sereno. Gabriel extremamente comovido entregava-se ao um pranto humilde.
-... Transtornado com o seu noivado, modificaste a tua conduta e o teu caráter;   mataste-lhe o noivo com duas flechas certeiras no peito e no pescoço, numa emboscada covarde e sem lhe dares oportunidade de defesa...
 O pranto de Gabriel tornava-se convulsivo com a estória  que lhe era narrada; dificultando ao lorde Arthur a seqüência. O jovem nobre olhou o médico suplicando-lhe forças e Ricardo lhe fez um sutil meneio de cabeça, então Arthur continuou:
-         .. Numa paixão doentia e estando ciente de que meu pai a levaria em viagem, resolvestes ferir meu irmão Anderson. soltando-lhe a sela da montaria, estavas certo de que isto atrasaria a viagem, mas com isto deixastes o teu sobrinho que tinha apenas  quatorze anos paralisado. Por um ato inconseqüente, o condenastes á um leito. Somente movimentava a cabeça, o resto de seu corpo não lhe obedecia.
Arthur levantou-se e caminhou até Gabriel, olhando-o nos olhos:
-         A minha irmã Brigith transformou os seus dias também em reclusão fazendo-lhe companhia. Dava-lhe conforto e força á suportar aquela vida em completa dependência. E tu Gabriel inconformado com sua ausência e não aceitando que ela dedicasse a vida ao infeliz irmão, premeditaste-lhe a morte enviando-lhe um chá de ervas venenosas. No entanto enganaste-te e quem tomou o chá mortal foi a tua sobrinha Brigith, o teu grande amor. Morreu instantaneamente carregando no ventre o filho que esperava...
Gabriel, soluçou aos prantos:
-         Por piedade senhor Lorde Arthur, nada mais me contes!
Mas o Lorde prosseguiu:
-         Num acesso de ódio e num desejo de vingança injustificável, covardemente matastes Anderson; completamente vulnerável em seu leito, asfixiando-o com uma almofada até a morte agonizante!
Lorde Arthur afastou-se dele para disfarçar as lágrimas que lhe desciam num sentimento profundo de dor. Sentou-se novamente.
-         Minha mãe Joane, a tua irmã, ciente de todos os teus crimes  pediu sigilo ao médico Ricardo seu confidente, mas tão logo faleceu em imenso desgosto; assim como faleceu o teu tutor, infelizes por teus atos tão vis; Ricardo em sua extrema fidelidade á nossa família tudo contou ao meu pai Lorde Orlando. Este ciente de que havias tirado a vida de teus filhos tão covardemente, resolveu não te condenar... deu-te a oportunidade de te regenerares, transferindo-te para nossa propriedade em Adredanha e oferecendo-te trabalho árduo para reflexão. Ao invés no entanto, de valorizares a tua atitude e a oportunidade que havia te concedido de reconstruíres uma nova vida, prosseguistes alimentando ódios e fugindo, atacaste-nos! Feristes e matastes servos inocentes... agora, apareces em nossa propriedade dizendo que de nada te lembras! Sempre foste ardiloso e agiste premeditadamente, como crês que possamos acreditar nisto?
Gabriel cabisbaixo mantinha-se em pranto emocionado.
-         Responde-me Gabriel, devo ter a mesma clemência de meu pai?
Gabriel controlou-se, balbuciando:
-         Me envergonho de tudo o que dizem eu ter feito; sinto-me criatura imensamente desprezível; matai-me senhor Lorde, para que não faça mais o mal!
Então ajoelhou-se no chão suplicante e descontrolado:
-         Por clemência matai-me  !
O Lorde Arthur surpreendeu-se com a aparente humildade e a extrema sensibilidade daquele homem. Olhou incógnito para o médico, que ainda não se mostrava convencido da sua perda de memória. Parecia-lhes uma ardilosa encenação . porem não compreendiam o objetivo.
-         Matar-te eu não vou... mas eu te condeno Gabriel a masmorra!
O jovem nobre finalmente silenciou exausto pela longa narrativa que lhe feria os mais profundos sentimentos. Pediu ao médico que chamasse os guerreiros para leva-lo a masmorra.
Quando ele foi levado pelos guerreiros o jovem deixou cair o rosto sobre a mesa, chorando convulsivamente. O médico Ricardo aproximou-se e silencioso amparou-o compreendendo-lhe na dor que sentia.
Linia observava o homem ser arrastado pelos guerreiros do castelo, rumo á masmorra, através do pátio central.
Pelo porte elegante e forte, sentiu-se intrigada e indagou a Lana:
-         conheces aquele homem que esta sendo preso? Nunca o vi antes!
Lana aproximou-se da janela e disse-lhe:
-         É o servo Gabriel; vi quando chegou  de manha com o médico Ricardo!
Linia olhou-a solicitando mais informações e Lana como não lhe tinha simpatia limitou-se a dizer-lhe:
-         De nada mais sei senhora.
Linia enfurecida, pela atitude da ama, dispensou-a ficando á sós com os seus pensamentos. Aquele homem, ainda que não tivesse  lhe visto o semblante, não saia dos seus pensamentos. Foi interrompida quando Lana retornou batendo na porta e dizendo-lhe que o Lorde a chamava na biblioteca.
Aprontou-se demoradamente e desceu para encontra-lo. A porta estava entreaberta e Linia entrou sem cerimonias. Arthur sem cumprimenta-la indagou:
-         Pensastes no que te disse?
Linia fingiu ter se esquecido, o que deixou o Lorde Arthur com o semblante contrariado. Ainda que já houvesse se refeito da enorme emoção, algumas horas antes, a sensibilidade lhe estava aflorada.
-           Repetirei Linia, o que decidistes? O prazo que te dei encerrou-se como as tempestades!
Linia olhou-o dizendo-lhe a contra gosto:
-         Aceito as imposições de meu irmão Lorde Arthur!
-         Então acolheras tua filha Sara agora; encontra-se ela no aposento ao lado do teu. Mandarei imediatamente chama-la para que lhe peças perdão!
Linia estava perplexa, em como a sua filha estava tão próxima e ninguém havia lhe comunicado; nem mesmo a sua serva Lana. Olhou o nobre com extrema seriedade mas concordou num gesto afirmativo.
Após algum tempo Sara entrava na biblioteca, carinhosamente amparada pelo médico, pois ainda não andava com facilidade.
Vendo a mãe, em pé próximo á janela, apertou a mão do médico violentamente. O Lorde olhou-a ternamente dizendo-lhe:
-         Sara, tua mãe deseja falar-te algo!
A menina continuava apertando a mão do médico e num impulso correu para abraçar fortemente Arthur. Pediu-lhe:
-         Senhor Arthur, não desejo falar com ela!
O nobre olhou-a confortando-a:
-         Não serás tu a falar querida, ela falará!
Voltou-se para Linia e indagou-lhe:
-         Então Linia, o que querias dizer a Sara?
Linia voltou-se olhando Sara próxima a Arthur e percebeu imediatamente que entre os dois existia grandiosa afetividade. Interessadamente pensou em usufruir-se disto. Mudando completamente o semblante, sorriu ternamente para Sara.
-         Minha filha querida, dê um abraço em sua mãe que sente imensa saudade!
A menina olhou-a indiferente, mantendo-se abraçada ainda ao jovem Lorde e disse-lhe friamente:
-         Não Linia, não sentistes minha falta! És mentirosa e falsa, e somente ages assim porque com certeza o nobre Arthur o impôs!
Linia corou com a atitude da filha e tentou atri-la:
-         Querida Sara, perdoai-me ter te deixado sozinha, porém o Lorde  Orlando tomava decisões tão apressadas... eu não tinha escolha!
O médico Ricardo olhou para o Lorde Arthur indignado, suplicando-lhe com os olhos que ele ordenasse que ela imediatamente, parasse com aquela encenação; porém a esperta menina tomou a iniciativa.
-         Parai já com isto Linia! Não sejas mesquinha!
O nobre e o médico novamente olharam-se e Sara puxou a mão de Arthur dizendo-lhe:
-         Meu tio, ficarei nesta casa com o senhor, mas nunca me obrigue a falar ou gostar dessa mulher!
O Lorde estava completamente surpreso e impressionado com a personalidade de Sara. Atendendo ao seu pedido falou:
-         Pode sair Linia voltai ao seu aposento!
Linia enfurecida e sentindo-se profundamente humilhada, saiu da biblioteca amaldiçoando-os.
Sara olhou Arthur e lhe disse carinhosamente;
-         Posso lhe dar outro abraço?
O jovem abraçou-a e Sara falou-lhe:
-         Ricardo contou-me que lhe darás umas terras, é verdade?
Arthur meneou afirmativamente e Sara prosseguiu:
-         Daí as terras para Linia, isto á fará feliz longe de nos! Deixai Ricardo aqui conosco!
-         Porque falas isto Sara?
-         Porque só assim Arthur, poderemos ser felizes!
O Lorde surpreendido falou-lhe:
-         Prometo-te que pensarei no que me pedes Sara.
-         Posso lhe falar mais uma coisa?
-         Claro querida Sara!
-         Gabriel falou a verdade, de nada se lembra!
O Lorde sentou-se rapidamente, sentindo-se confuso. O médico percebendo-lhe a expressão de imensa surpresa, pediu a menina que se despedisse, precisava repousar. Sara prontamente o fez e o médico após acompanha-la ao aposento, retornou para falar com Arthur. O jovem vendo-o entrar indagou-lhe com certa indignação.
-         Ricardo, é apenas uma menina, porque sempre lhe contas tudo a respeito de Gabriel, ou de nossos problemas?
O medico compreensivo compreendeu-lhe a confusão, falando-lhe sereno.
-         Nunca nada lhe contei, senhor Arthur!
O lorde Arthur surpreso argumentou prontamente.
-         Como sabe de tudo então? Como contou a Carol a estória de Gabriel com tantos detalhes? Como sabia que lhe era o filho?
Ricardo olhou-o com seriedade dizendo-lhe:
-         Senhor Lorde Arthur, ainda tenho muitas coisas a contar-lhe sobre Sara, porém o sol já alto vai e necessário se faz a sua presença nos campos!
-         Estas certo Ricardo, porém cavalgarás comigo e tudo poderás contar-me no caminho!
O médico concordou e ambos saíram do castelo e montados em seus cavalos saíram a supervisionar  as tarefas dos servos.

                                          
                          


                             Gabriel na masmorra, olhou os pastos  ainda cobertos pela neve, as colinas, o rio; as lagrimas ainda lhe desciam vorazes pela face sentindo-se entristecido pela vida vergonhosa que tivera mas da qual não conseguia recordar-se.
Viu quando o medico Ricardo e o Lorde Arthur subiam as colinas, cavalgando em imponentes cavalos e gritara-lhes angustiado:
- Matai-me por clemência...matai-me!
Mas a voz simplesmente ecoou mórbida na pequena cela. Surpreendentemente lembrava-se da doutrina que aprendera e estava ciente do que era uma moral boa e uma moral má... violara todos os princípios bons!
Ajoelhou-se desesperado no chão frio e pediu clemência para a dor insuportável que lhe corroía a mente entorpecendo-lhe os sentidos. Deixou-se deitar no chão de pedra; as palavras de lorde Arthur ecoavam-lhe na mente assustadoramente "matastes covardemente..." não compreendia porque nada conseguia recordar de seu passado. Sentia-se julgado e condenado por matar pessoas que não conhecia em suas lembranças; sentia-se bom e justo incapaz de cometer tantos atos bárbaros que haviam sido lhe narrados. Auxiliara prontamente aquela nobre senhora Carol, e aquela meiga menina Sara na gruta...como poderia ser capaz de cometer tantos atos infames...precisaria ser um monstro sem sentimentos e não conseguia se ver assim!
Sentia enorme compaixão de si mesmo por nada conseguir se recordar! Porem sentia também a enorme dor daquele jovem lorde, que ainda tão menino perdera os irmãos por sua culpa! Como se sentir culpado por algo que não se recorda; eles nunca acreditariam no que dizia! Como poderiam acreditar depois de tudo o que disseram ter feito! Não lhes criticava a condenação, compreendia-lhes; desejava se desculpar! Corrigir seus erros se possível fosse! Fazer alguma coisa que pudesse mostrar que era uma pessoa boa e que estava sentindo imensamente tudo o que lhe fora contado. Como provar-lhes que o sentimento era imensamente sincero e sofrido!
Gabriel extremamente abatido encolhera-se num canto da cela e ali ficara, imóvel, desejando ardentemente dormir para não mais despertar.
                                  




                         Um longo período se passou, em dias abençoados de imensa claridade e calor.
Os campos haviam se revestido do verde da vida e inúmeras flores coloridas embelezavam-nos.
O lorde Arthur com auxilio de seu amigo Ricardo e dos seus servos haviam reconstruído a propriedade. Arvores frutíferas replantadas no imenso pomar mostravam enorme vitalidade, as plantações novamente semeadas, tinham germinado com força e total vigor, o rio corria veloz novamente.
O jovem lorde ensinara Sara a cavalgar elegantemente e com arte. Freqüentemente os acompanhava nas cavalgadas.
O medico Ricardo incumbira-se de continuar a doutrina-la e Sara já conseguia ler e escrever com desenvoltura.
Carol auxiliava a administrar a moradia deixando-a aconchegante e acolhedora. Era uma verdadeira mãe para todos, menos para os olhos do medico que a viam cada dia com maior afeição.
Linia mantinha-se isolada naquela família feliz. Participava das refeições e das horas comuns de lazer e repouso, mas nenhum deles se aproximava para dialogar ou pedir opiniões, numa distancia imposta por si mesma em sua frieza, superioridade e diário mau humor .Naquele lar harmônico, Linia se tornara o canto frio e feio, do qual ninguém desejava se aproximar, nem mesmo os servos. Soubera que o seu irmão Arthur, enviara um mensageiro com um manuscrito desfazendo o seu noivado. Sentia-se enfurecida pela viuva que era, pela filha que a ignorava e pela felicidade que todos sentiam e que não advinha ao seu coração petrificado. Sentia-se infeliz!
Naquela manhã Carol aproximou-se do lorde Arthur sorrindo-lhe candidamente.
-         Posso falar-lhe Arthur?
O lorde carinhosamente acolheu-a também com um sorriso, pedindo-lhe que se sentasse, o que também fez.
-         Que desejas amiga Carol?
A nobre senhora falou-lhe humildemente.
-         Faz um ano que me acolhestes em teu lar; me sinto extremamente feliz e reconfortada com esta nova vida; nada deixastes que me faltasse!
O nobre disse-lhe com extrema ternura.
-         Fiz tão pouco ainda Carol. Se me pedires o impossível farei de tudo para realiza-lo para ti, estejas certa disto; não como recompensa ou pagamento ao que muito sofrestes, mas com profunda admiração e amor pela pessoa que és!
Mostrando-se sensibilizada e agradecida por suas doces palavras, Carol temerosa encorajou-se a dizer-lhe.
-         Vou pedir-lhe o impossível lorde Arthur!
O jovem olhou-a intrigado e em sua candura e serenidade pela primeira vez podia perceber-lhe o peito ofegante e o olhar ardente em suplica.
-         Perdoai-me senhor, mas é o coração de uma mãe muito aflita que lhe pede; deixai-me visitar na masmorra o meu filho Gabriel!
O nobre mostrou-se surpreso e Carol continuou em suplica.
-         Sei dos seus atos bárbaros; sei do imenso mal que lhe fez; mas compreenda o sentimento desta pobre mãe que anseia em vê-lo e lhe dar o amparo que nunca pôde dar. O coração materno,  ama acima de todos os  erros ou imperfeições de seus filhos...os alenta e os orienta ainda que estes se encontrem confusos, perdidos ou em vida errônea . Desejo ardentemente visitá-lo, ampara-lo, reconforta-lo e orienta-lo!
Arthur refletiu silenciosamente em suas palavras tristes observando-lhe os olhos ansiosos. Sorriu-lhe dizendo.
-         Amiga Carol, como poderia eu negar a aproximação de uma mãe com seu filho, ainda mais , com o sincero desejo de auxilia-lo; poderás ir visita-lo e orientai-o para que compreenda os inúmeros males que fez!
Carol, extremamente agradecida, num impulso abraçou-o . Mas o jovem fechando o semblante em seriedade, olhou-a advertindo.
-         No entanto amiga Carol, és também uma grande mãe neste coração e se Gabriel ousar te ferir ou te agredir mandarei puni-lo compreendes?
A nobre senhora sentindo-se profundamente feliz por seu afeto e consentimento na visita ao filho, beijou-lhe as mãos. O jovem abraçou-a em repleta emoção.
-         Vai querida Carol, pedirei a Ricardo que te acompanhe á masmorra; não desejo que lá vás só!
Carol novamente agradeceu-lhe saindo  radiante e muito feliz.
O sol já alto ia, quando Arthur afastou-se de Ricardo para que este acompanhasse Carol em visita a Gabriel.
A pequeno recinto estava claro, mas Gabriel mantinha-se deitado no chão frio; parecia estar dormindo. Ricardo manteve-se próximo á porta, que fora aberta pelo guerreiro, enquanto Carol se aproximou serenamente.


                           

                                 A cela estava úmida e fétida ; mas a nobre senhora parecia não se incomodar com o ambiente.
Carol acariciou-lhe o rosto delicadamente e Gabriel abrindo os olhos muito sonolento e aparentemente abatido, balbuciou:
-         Um anjo!
Esfregando os olhos, levantou-se envergonhado, reconhecendo-a.
-         Perdoai-me senhora Carol!
Gabriel olhou para o medico, que tão pouco conhecia, também dizendo-lhe.
-         Perdoai-me senhor !
Ricardo podia observar que Gabriel apesar das acomodações rudes, estava sendo bem cuidado. O corpo mantinha-se forte e robusto e a fisionomia ainda que abatida, mostrava um brilho saudável. Estava limpo e barbeado. O nobre Arthur fora extremamente generoso dando ordens aos guerreiros para que nada lhe faltasse; tinha água em abundância,  alimento farto nas três refeições diárias, e possibilidade de higiene constante em si e na sua cela!
Carol olhou para Ricardo suplicando-lhe.
-         Amigo Ricardo, deixai-nos um pouco sozinhos!
O medico um pouco hesitante, afastou-se da porta da cela e aguardou-a a certa distancia junto com o guerreiro que o vigiava. Carol olhou o filho enternecida e Gabriel sentiu-se constrangido.
-         Senhora Carol, não me recordei de nada; nada me lembrei dos muitos males que fiz; sinto-me imensamente mal com isto! Juro-lhe por minha vida; estou sendo sincero!
Carol pegou-lhe a mão dizendo-lhe serenamente.
-         Confio no que me dizes Gabriel; não terias mais motivos para enganar-nos!
Indagou-lhe então desconfiado.
-         Porque a senhora veio até aqui?
-         Precisava ver-te Gabriel!
-         Porque a senhora sente piedade de um criminoso como eu?
Carol não conseguia mais conter o pranto emocionado, revelando-lhe tremula:
-         Não és um bárbaro criminoso para mim... és o meu filho cheio de erros e de imperfeições, estou ciente disto; mas ao qual Nosso Pai ainda concede contínuos amanheceres, doando-te a incessante oportunidade de te  regenerares; e se Nosso Pai ainda ainda zela por ti com infinita bondade,  porque esta humilde mãe, não te ampararia?
Gabriel imensamente surpreso indagou:
-         Seu filho?
Carol olhou-o afetivamente, e contou-lhe a sua longa estória. Extremamente emocionados ambos se abraçaram fortemente e Gabriel sentiu uma enorme sensação de paz que há muito não sentia.
Dialogaram longamente.  Carol contou-lhe pausadamente, os inúmeros erros que ele cometera. Tentava faze-lo compreender, que precisava reconhecer, arrepender-se e reparar de alguma forma todo o mal feito. Aconselhou-o a pedir contínuo perdão a Deus por suas imperfeições e a dar-lhe graças por cada dia em que lhe concedia nova oportunidade á continuidade da vida;
Gabriel dizendo-lhe que refletiria em tudo o que dissera e prometendo-lhe que faria orações freqüentes, despediu-se agradecido de Carol. A nobre senhora ainda emocionada, porem sentindo-se imensamente feliz, afastou-se afirmando que o visitaria todos os dias.
Ricardo que presenciara tudo, ainda que não escutasse o que diziam, percebeu que Gabriel parecia ter sofrido grande transformação realmente. Se mostrava sensível, afetuoso e humilde.
Ambos saíram da masmorra e Gabriel caminhou até a pequena janelinha, olhou o céu azul, e agradeceu fervorosamente a Deus, o amparo tão sereno e meigo que trouxera para si, abençoando-o com uma mãe.






                                     


                                O nobre Arthur  aproximou-se de Linia, que se encontrava no salão, tocando na harpa uma triste melodia. Vendo-o aproximar-se Linia parou instantaneamente. Estava ciente que o irmão só se aproximava dela para lhe instruir como se comportar em determinadas reuniões daquela  "família" feliz.
Olhou-o indiferente e o Lorde sentou-se para falar-lhe:
-         Linia, sinto que não és feliz neste grupo familiar; nada fizestes também, para cativar Sara ou aproximar-se de Carol... manténs-te reclusa em teu aposento ou te fechas em semblante sério e rude em nossas reuniões! Passou-se um ano em  deste convívio comum; Poderias ter reconstruído uma vida alegre; mas não o fizestes...
Arthur caminhou até a lareira e voltou-se novamente para olha-la. Linia se mantinha altiva e fixando-o os olhos , mas permanecia indiferente. O nobre continuou:
-         Percebendo isto, resolvi atender um pedido de tua filha Sara; junto com meu amigo Ricardo delineei parte desta propriedade, e essas terras serão tuas! Deverás administra-las e planta-las. Em cinco dias grande moradia estará concluída; e será digna de vossa nobreza. Colocarei a teu serviço cinqüenta servos que te ajudarão no plantio e na organização de tua moradia. Poderás ainda levar a serva Lana que já se acostumou com as tuas amarguras e rispidez!
Arthur  voltou a sentar-se sempre olhando-a com seriedade:
-         Em cinco dias, serão transferidos para as tuas terras, as tuas vestes e os teus pertences; os servos, suprimentos básicos para a alimentação de todos por longo período e alguns animais... daqui a cinco dias não farás mais parte dessa família feliz, que sei, te contraria em demasia!
O Lorde respirou profundamente e complementou:
-         Estou sendo imensamente justo e para provar-te isto, mandei lavrar um título para ti; á partir dessa data serás a Duquesa Linia de Corleanos; única irmã de Lorde Arthur de Corleanos e filha do falecido Lorde Orlando de Corleanos.
Linia olhou-o arrogante e disse-lhe:
-         Nada me caberá da grandiosa fortuna de meu pai?
Lorde Arthur estava perplexo com sua extrema ambição. Falou-lhe indignado:
-         Linia, como és avarenta... filha bastarda de meu pai, não crês que muito reclamas? Dou-te grande propriedade, servos, suprimentos e animais; deu-te inúmeras jóias o nosso pai... desejas mais riquezas?
Deu uma pausa para se recompor e depois disse irônico:
-         Plantarás tua propriedade se desejares comer, pois os suprimentos que te concedo, um dia findarão e nada mais terás de mim! Deixo em testamento também devidamente lavrado, que toda a herdade dos Corleanos irá para a Duquesa Sara de Corleanos, minha sobrinha, se algo me acontecer. Será o Lorde Ricardo Lamartine o seu tutor, até esta ter idade de administrar todas as suas propriedades, inclusive a tua irmazinha...
Arthur caminhou até ela e colocando a mão em seu ombro advertiu-lhe:
-         Por isto minha querida, em sua enorme ambição, não almejes minha morte, pois perderás tudo o que te dou agora!
Pisando forte o nobre jovem se afastou, deixando Linia  a sós com seus pensamentos. Irritada agrediu as cordas da harpa que bravejaram forte som estridente.


                              Durante aqueles cinco dias, não houve um só dia em que Carol, não visitasse Gabriel na masmorra. Lorde Ricardo, sempre em sua companhia, se surpreendia com sua candura.
Naquela tarde, o Lorde Ricardo procurou o Lorde Arthur para conversar; o nobre recebeu-o amigavelmente com um sorriso como sempre o fazia:
-         Querido Ricardo , a que vens?
Ricardo com o semblante constrangido, meio envergonhado, balbuciou:
-         Desejo lhe fazer um pedido senhor Arthur!
Arthur deu uma risada infantil.
-         Precisas corar para pedir-me algo? Vejo que o pedido é sério. Falai!
Ricardo trêmulamente falou:
-         A senhora Carol pelo que estou ciente, não possui outra família; nós somos-lhe a família!
-         Sim Ricardo, considero-a como minha mãe!
Ricardo caminhou intranqüilo de um lado para o outro e Arthur aflito indagou-lhe:
-         Ricardo, vieram da masmorra á algumas horas, aconteceu algo com a senhora Carol? Gabriel a ofendeu?  A maltratou? Dizei-me agora, não te retardes mais!
O médico parou de caminhar, percebendo a preocupação do jovem e disse-lhe prontamente:
- Nada aconteceu com a senhora Carol, mas é que ...
-         Sempre fostes direto e objetivo, porque temes tanto em dizer-me algo?
Ricardo então encorajando-se  pediu-lhe humildemente:
-         Desejo , senhor Lorde Arthur, pedir  a senhora Carol em casamento!
Arthur vendo-o baixar a cabeça constrangido, controlou-se para não gargalhar eufórico, mas sorriu-lhe radiante.
-         Que enorme felicidade amigo Ricardo; já falastes com ela de tuas intenções!
-         Não senhor Arthur, vim aqui humildemente lhe pedir, que diga-lhe, que á pedi em casamento. Desejo ardentemente desposa-la, porque enorme sentimento lhe tenho! Receios tenho no entanto, que não me deseje como esposo!
-         Não te angusties assim amigo, conversarei com Carol ainda hoje e lhe falarei de seu pedido e de seu enorme sentimento...
Arthur não mais conseguindo conter-se em seriedade; deu a costumeira risada espontânea e ainda infantil. E rindo falou-lhe:
-         Tens idade para ser meu pai... nunca pensei que me pedirias a mão de alguém em casamento!
Ricardo meio contrariado com a brincadeira de Lorde Arthur, sorriu-lhe envergonhado e agradecendo afastou-se; deveria verificar como estava a mudança de Linia para a sua propriedade.
Indagando alguns servos, soube que a maioria das coisas já havia sido transferido; somente a Duquesa e os seus pertences ainda estavam no castelo.
A Duquesa Linia despediu-se de seu irmão friamente, fazendo-lhe mera reverencia sutil. Lorde Arthur, possuidor de bons sentimentos, olhou-a afetuosamente.
-         Desejo-te toda a felicidade deste mundo Linia!
A jovem sem mostrar qualquer gesto de simpatia afastou-se entrando na carruagem que já a aguardava. Lorde Arthur percebendo que a carruagem se distanciava disse a Ricardo que estava próximo a si:
- Sinto imensa dó de minha irmã; terá tanto a aprender! Que o bondoso Deus á acompanhe!



Anoitecia quando todos se reuniam no salão de refeições. Sara radiante por não termais a presença de Linia, tagarelava feliz as novidades de seu dia.
A senhora Carol dando-lhe toda a atenção e carinho, parecia também se sentir feliz com o ambiente mais sereno.
Lorde Arthur, com jeito por vezes ainda tão menino olhava o medico Ricardo, em cumplicidade, ameaçando-o de falar ali sobre o seu pedido; Ricardo nervoso com as brincadeiras do lorde mal conseguiu alimentar-se.
Após a farta refeição, foram para o amplo salão e Sara colocou-se a tocar alegre melodia que aprendera no órgão.
Lorde Ricardo, pediu-lhes licença e afastou-se inibido, ciente de que Arthur aguardava oportunidade a falar com a senhora Carol a sós.
Lorde Arthur aproveitando-se da ausência proposital de Ricardo, sentou-se defronte a Carol e disse-lhe:
-         Querida Carol, fizeram-me hoje um incrível pedido!
A nobre senhora olhou-o intrigada:
-         Contai-me Arthur!
Arthur sorriu feliz e falou:
-         Fostes pedida em casamento!
Carol olhou-o contrariada mas sorridente.
-         Deixai de peripécias Arthur...não és mais um menino para viveres sempre a brincar!
O lorde Arthur olhou-a então em seriedade e lhe disse:
-         Perdoai-me a brincadeira Carol! No entanto é serio o que lhe digo, pediram-me a sua mão em casamento!
Carol observando a seriedade de Arthur ficou tremula e corou em constrangimento.
-         O lorde Ricardo Lamartine deseja desposa-la pelo enorme sentimento que lhe tem...
Arthur observando-lhe a seriedade novamente sorriu e brincou:
-         A senhora entendeu, não? Ele está apaixonado!
Carol mantinha-se silenciosa e a emoção foi aparecendo pouco a pouco em lagrimas sutis que lhe desciam as faces.
-         Porque choras Carol? Te ofendi com minhas brincadeiras?
A nobre senhora meneou a cabeça em negativa e então pegando a mão de lorde Arthur falou tremula:
-         Passei a minha vida tão só...os sonhos e as fantasias da menina que eu era, morreram naquele rio...
O nobre jovem apertou-lhe a mão tentando reconforta-la.
-         Ficai feliz Carol, alguém deseja nunca mais te deixar só!
A senhora olhou-o secando as lagrimas.
-         Nobre Arthur, não compreendestes, o meu pranto é de felicidade!
-         Irás aceitar?
-         Irei agora falar-lhe, porque não sou mais uma menina...sabes onde foi?
Arthur olhou-a feliz dizendo-lhe:
-         Me espera no pátio; fiquei de lhe dar a sua resposta!
Carol beijou-lhe as mãos agradecendo e caminhou decidida a encontrar Ricardo no pátio.
Avistou-o caminhando nervoso e de cabeça baixa.
-         Senhor Lorde Ricardo...
Ricardo virou-se surpreso com sua presença.
-         ... Desejo imensamente falar-lhe!
Carol caminhou até aproximar-se de Ricardo e pegando-lhe a mão carinhosamente disse-lhe:
-         Imensa alegria trouxe ao meu coração o seu pedido, e aqui vim para falar-lhe que desejo imensamente ser a sua companheira. O admiro e o respeito com toda a força deste humilde coração! Sempre fostes, desde que nos conhecemos o amigo presente e fiel, o confidente de integra confiança, o protetor incansável...Tenho-lhe enorme sentimento de afeto e aceito acompanhar-te enquanto aqui viva!
Sem se dizerem mais palavras, abraçaram-se fortemente e longo tempo assim permaneceram em silencio e no autentico amor que pulsava intenso sob a noite que os abençoava.
Ricardo e Carol entraram no salão nobre dando-se as mãos.
Lorde Arthur que estava próximo a Sara,  auxiliando-a no órgão; vendo-os juntos e de mãos dadas sorriu feliz falando eufórico.
-         Marcaremos a data de vossa matrimonio para breve! Faremos uma grandiosa festa, para oficializarmos a união!
Levantando-se Arthur caminhou até eles também de mãos dadas com Sara e continuou:
- ...farei questão de ser o padrinho de vosso casamento, e Sara ainda que seja tão menina será a vossa madrinha!
Sara exultou em felicidade com a novidade e abraçou-os fortemente.
Ricardo olhou Carol sorrindo-lhe e disse sentindo indescritível felicidade:
-         Serão os nossos padrinhos, querida Carol!
A data do casamento foi prontamente marcada para seis meses depois. No dia seguinte lorde Arthur escreveu vários manuscritos; um chamava o frei para celebrar a cerimonia; os outros convidavam alguns amigos da corte e das propriedades vizinhas para a grande comemoração. A pedido de  Ricardo, o lorde Arthur também enviou um convite para a Duquesa Linia.


                              Com os enormes preparativos para o grande acontecimento os  dias passaram breves. O castelo era enfeitado e adornado, tornando-se demasiadamente alegre e bonito.
Carol e Ricardo não conseguiam esconder o enorme contentamento na breve união, sempre sorridentes e em extrema felicidade. No entanto por vezes a nobre senhora ficava silenciosa e entristecida. O lorde Arthur percebendo-lhe a estranha melancolia, resolveu falar-lhe.
-         Amiga Carol, observo-te já algum tempo e percebo que a felicidade não te é completa; o que te falta?
Carol  surpresa com sua observação , falou candidamente:
-         Como poderia estar completamente feliz, se sei que meu filho Gabriel, á dezessete meses, encontra-se enclausurado num recinto minúsculo...não creia no entanto que o culpo meu querido Arthur! Sei que a condenação foi correta e justa! Porem o coração desta mãe que também te ama,  sente-lhe a solidão e se aflige...Conforto-me em meu leito macio mas vejo-o freqüentemente, dormindo no chão duro e frio; Trajo-me em vestes limpas e perfumadas, mas quando o visito ainda que tenhas dado ordens para que se banhe todos os dias, as vestes estão sempre sujas e fétidas; Passeio freqüentemente pelos jardins e colinas desta propriedade com Ricardo, mas quando vou á masmorra me dói o coração de vê-lo com tanta saúde, restrito a quatro paredes...
As lagrimas desciam sofridas mas tênues, nas faces de Carol, e pela segunda vez Arthur a via intranqüila e angustiada.
-         Sei que matou inocentes, ferindo-os sempre covardemente; Porem isto não o faz menor em meu imenso amor; como exclui-lo de um sentimento intenso que deseja amparar e proteger...
Carol secou as lagrimas com as mãos, desculpando-se constrangida.
-         Perdoai-me meu querido! É apenas um desabafo da dor que por vezes  corrói o meu ser!
Arthur compreensivo apiedou-se de sua amiga, mas permaneceu silencioso e Carol explicou-se, tentando não culpa-lo.
-         Estou imensamente dividida nos valores que sinto...sei que fostes bom e justo impondo-lhe a branda pena da reclusão; Tens lhe ofertado generoso alimento e farta bebida; Semanalmente mandas os servos limparem o recinto e sua veste é trocada diariamente quando se banha; Permitiste-me as visitas diárias e nestas, lhe tenho levado livros para que leia...Dei-lhe até um antigo Evangelho para que refletisse no quanto infringiu a lei divina; Mas o lado de mãe piedosa deseja ardentemente vê-lo livre e feliz...Compreendes meu filho, a tristeza que por vezes  aflora em meu semblante?
O lorde meneou a cabeça afirmativamente, passando os seus dedos levemente nas faces de Carol para secar-lhe as lagrimas que ainda corriam; sentindo-se profundamente emocionado com tudo o que lhe contara de seus sentimentos abraçou-a tentando conforta-la em sua dor.
Pedindo-lhe desculpas, Lorde Arthur viu-se obrigado a se afastar porque precisava receber o frei que acabara de chegar ao castelo.
Após o frei ser alojado adequadamente, lorde Arthur mandou chamar Ricardo que se encontrava nos campos supervisionando o trabalho dos servos.
Recebendo o recado, Lorde Ricardo apressou-se  a retornar ao castelo.


Encontrou Arthur aflito na biblioteca.
-         Mandaste-me chamar, lorde Arthur?
-         Sim Ricardo, entra e senta-te; muito tenho a falar contigo!
Ricardo sentou-se comodamente e Arthur indagou-lhe:
-         Como vês a educação de Sara?
-         É uma menina muito inteligente senhor Arthur, e tenho a doutrinado continuamente; sabe ler e escrever corretamente; gosta de aqui ficar e empenha-se em ler, por vezes, tardes inteiras; gosta de musica e como sabes já toca perfeitamente bem na harpa e no órgão; Carol a tem ensinado também a bordar e a cozinhar...é destemida e gosta de cavalgar conosco...
-         Sei de tudo isto, meu amigo , o que te indago é se isto lhe é suficiente!
-         Não entendo tua preocupação senhor, tem uma educação mais rigorosa que tua irmã Brigith!
O lorde Arthur olhou-o fixamente:
-         Mas está ficando uma linda moça e não lhe desejo o mesmo destino que minha doce irmã; preciso protege-la... não seria melhor, manda-la para um educandário na corte? Estaria em segurança!
Ricardo olhou-o com seriedade.
-         Seria ela feliz, num educandario, senhor?
O jovem vagou silenciosamente e depois disse-lhe:
-         Sara está com dez anos, e eu gostaria que ela viajasse com o frei após a cerimonia . Este a deixaria num educandário na corte. Após cinco anos, quando estivesse pronta a casar-se um de nós iria busca-la!
O medico caminhou na direção do nobre, sentia-se surpreso com a sua repentina vontade de afastar Sara do convívio familiar. Estava ciente de que ambos eram imensamente felizes juntos, no convívio diário divertiam-se continuamente em longos cavalgadas, em passeios nos jardins do castelo em longos diálogos, nas opiniões que lhe pedia a respeito de alguns problemas na propriedade e ainda que Sara fosse muito jovem,  inúmeras vezes o vira aceitando seus conselhos. Indagou-lhe perplexo.
-         O que temes de verdade, senhor lorde Arthur?


Lorde Arthur baixou a cabeça, evitando-lhe o olhar e falou comovido.
-         Sinto-me envergonhado Ricardo mas sei que nada posso esconder de ti. Sempre fostes um pai carinhoso para mim!  Confiastes plenamente no menino que eu ainda era, quando te procurei em Adredanha; e em generoso e continuo amparo vens me acompanhando; instruindo-me e orientando-me. Em todos os momentos, ali estavas auxiliando-me a vencer dolorosos sentimentos e inúmeros problemas. Tudo aconteceu tão rápido! Foram apenas poucos anos, mas tanto aprendi contigo! Sinto como se fosse uma vida! Estou agora com dezessete anos e ainda tenho tanto a aprender e a viver! Preciso ainda tanto de teus conselhos e de tua experiência!
O jovem deu uma pausa, sentindo-se fragilizado pela emoção, e respirando profundamente confidenciou-lhe.
-         Em minha jovialidade, eu nunca encontrei nenhuma jovem, que me encantasse o coração como Sara. Sinto-me deslumbrado; o sorriso de Sara me seduz, me fascina, me atrai; não consigo mais vê-la distante; passo os meus dias ansiando te-la em minha companhia! Estou ficando louco Ricardo; sinto-me culpado; ela é apenas a minha sobrinha e é ainda uma menina de dez anos!


Ricardo apiedou-se do lorde e carinhosamente pediu-lhe que se sentasse. Colocando-lhe a mão no ombro falou-lhe:
-         Escuta o que te digo, lorde Arthur, não é errado enamorastes de tua sobrinha; Inúmeros matrimônios ocorrem nos mesmos laços consangüíneos; para que assim as famílias se mantenham em sangue nobre; Ocasionalmente ocorrem problemas com os seus filhos mas isto não é a rigor...Errado no entanto, é a faixa etária em que Sara se encontra;  Pelo que me contastes concordarei contigo, em que afastes a menina Sara do castelo, até que atinja idade mais apropriada a enamorar-se de alguém.
O medico percebendo que Arthur tranqüilizava-se com suas palavras, prosseguiu:
-         Comprometo-me a busca-la na corte quando completar os quinze anos...se o sentimento que lhe tens sobreviver ao tempo, e ás inúmeras experiências que terás em convívio com outras mulheres, serei o primeiro a te apoiar para que cases com ela; estarás então com vinte e dois anos e haverás amadurecido.
Arthur mais tranqüilo por ter repartido com seu amigo, os seus sentimentos e sentindo-se  mais uma vez agradecido por suas sensatas orientações. Falou-lhe:
-         Ricardo, temos outro problema serio a resolver!
O medico escutou-o atencioso.
-         Carol se angustia e sofre com a reclusão do filho na masmorra, nunca conseguirás faze-la completamente feliz e sei também que sofrerás com isto; que faço?
Ricardo pensou demoradamente e depois falou-lhe:
-         Nestes cinco meses tenho a acompanhado freqüentemente á masmorra; não houve um só dia que não fosse acompanha-la. Tenho observado imensamente Gabriel e conclui que realmente que a perda de memória foi real. Sempre se mostrou educado, humilde e amável com Carol e profundamente arrependido de incidentes dos quais não se recorda...
O medico deu uma pausa ofegante para respirar:
-         ...ouvi-o certa vez, dizer a sua mãe, que desejaria ter uma oportunidade para reparar o imenso mal que te fez, ainda que fosse uma pequena parte deste!
O jovem nobre suplicou-lhe.
-         Que farias com Gabriel, amigo Ricardo?
Ricardo falando determinado mas temeroso; aconselhou-o .
-         Libertaria-o, sob vigilância rígida diária! Colocaria um guerreiro de inteira confiança sempre ao seu lado; fosse no aposento onde dormisse ou no local onde se banhasse; fosse na companhia de Carol ou em passeios; Também lhe daria um trabalho e neste também estaria acompanhado... Libertaria-o mas lhe daria uma sombra!
Arthur gostava das conclusões de Ricardo, sempre ponderadas e sensatas, e por isto lhe era o pai, o confidente, o administrador e o amigo. O medico percebendo a ansiedade daquele jovem nobre argumentou.
-         Lorde Arthur, creio que Gabriel, recluso em um pequeno recinto, completamente isolado e privado do convívio,  poderá somente reconhecer e arrepender-se do imenso mal que fez, no entanto estará impossibilitado de tentar repará-lo, reconstruindo uma vida nova!
O jovem indagou-o curioso.
-         Ricardo e onde o hospedarias?
O medico olhou-o hesitante porem disse-lhe:
-         Concedeste a nobreza a tua irmã bastarda, reconhecendo-lhe o sangue... Lorde Arthur, se existir misericórdia em teu coração, e com ela conseguires perdoar os inúmeros males que fez a tua família, reconhecei-lhe também a nobreza! É teu tio e o irmão de tua doce mãe Joane. Reconhecei-lhe o sangue!
O jovem parecia refletir silenciosamente; A emoção ainda lhe aflorava em faces rosadas, quando pensava nas mortes de seus irmãos, Brigith e  Anderson. Pensou incógnito "... como poderia conviver diariamente, com aquele que os  matara!"
-         Perdoai-me Ricardo, mas não seria capaz de manter convivência amigável com alguém que matou os meus irmãos...o sentimento ainda me fere em demasia!
-         Compreendo-te senhor Arthur; aconselhei-te que lhe concedesses a nobreza reconhecendo-lhe o mesmo sangue; No entanto creio também não ser certo que resida aqui no castelo!
Lorde Arthur indagou-o perplexo.
-         Moraria aonde Ricardo?
-         Deste-me umas terras e como sabes lá construi uma modesta moradia; Carol deseja ficar no castelo contigo, até que te cases... deixai que Gabriel viva lá!
-         Mas a tua propriedade fica a somente uma hora de cavalgada...não é demasiadamente próximo?
-         Suficiente para podermos vigia-lo nobre Arthur! Poderíamos colocar lá alguns servos fieis nos quais podessemos confiar!
-         Mas Ricardo, o guerreiro que lhe seria a sombra como poderia alertar-nos de algo errado que pretendesse, se não poder sair do seu lado?
-         Pensastes bem Arthur, a sua obrigação será proteger-nos vigiando-o incessantemente, mas não informar-nos continuamente de como Gabriel  vive...
Pensou um pouco e continuou:
-         ...Silvio já é um rapaz esperto e mostrou-se extremamente fiel, colocai-o na propriedade de Gabriel, e com certeza ele nos manterá informados.
Arthur pensava apressadamente em tudo o que Ricardo lhe sugeria.
Colocou-lhe a mão no ombro e disse-lhe agradecido:
-         Irei ver Gabriel, e tirarei minhas conclusões! Agradeço-te o imenso auxilio que me destes mais uma vez! Obrigado Ricardo!
Arthur abraçou-o emocionado e sentindo que uma enorme tranqüilidade substituíra a ansiedade e a fragilidade que sentia antes de o chamar para dialogar. Sorrindo em paz , afastou-se.







                                 O entardecer apresentava-se sublime quando o jovem lorde Arthur subiu á masmorra determinado.
A cela já fazia-se escura, mas Arthur percebeu que aquele forte homem de vinte e sete anos estava próximo á janela.
-         Gabriel, vim falar contigo!
Gabriel olhou surpreso a visita inesperada, estava o lorde acompanhado de dois guerreiros, um deles prontamente acendeu uma tocha que clareou o recinto, iluminando-lhes as faces em tons avermelhados das chamas que ardiam.
-         Tua mãe sofre em demasia por ti...
Gabriel baixou a cabeça humildemente dizendo-lhe:
-         Senhor lorde, matai-me para que não faça mais ninguém sofrer! Tens inúmeros motivos para isto...dai-me veneno, eu mesmo darei fim nesta vida tão prejudicial a tantos...
-         Cala-te Gabriel!
As lamurias de Gabriel e aquele recinto muito o incomodavam.
-         Deverás ouvir-me atentamente...
Arthur caminhou até á janelinha e visualizou o sol se escondendo sob as colinas, o rio cortando sereno as pastagens verdejantes, os cavalos imponentes sendo trazidos para o celeiro, e se sentiu mais tranqüilo. Voltou-se e continuou:
-         Dizia que tua mãe sofre muito por ti...deve ter te falado que irá casar-se na próxima semana com o lorde Ricardo...
Gabriel olhava-o atentamente e Arthur concluiu que compreendia.
-         ... desejo lhe fazer feliz porque é a mãe que não mais tenho; no dia do casamento, mandarei libertar-te...
Gabriel deu um suspiro ofegante de surpresa.
-         ... te trajarás nobremente para a levares ao altar...será o meu presente de padrinho! Serás apresentado a todos os convidados como Lorde Gabriel Vandak, filho do Duque Vandak e irmão da Duquesa Joane Vandak Corleanos; com isto reconhecerei publicamente o tio que me és! Participarás da festa e finda esta retornarás ao aposento ...no dia imediato irás para a propriedade de lorde Ricardo Lamartine e lá viverás com alguns servos; Administrarás a futura moradia  e a propriedade de tua mãe Duquesa Carol Vandak Lamartine...
Gabriel havia baixado a cabeça diante de tanta benevolência e misericórdia. Deixou-se cair de joelhos sentindo-se muito pequeno diante da grandeza daquele jovem e aos prantos beijou-lhe os pés.
-         Levanta-te Gabriel!
O servo Gabriel levantou-se com dificuldade, tamanha era a emoção que sentia.
-         Pelos restos de teus dias, haverá sempre contigo um guerreiro que te acompanhará noite e dia onde quer que estejas; esta é a minha única imposição á tua liberdade!
Dizendo isto Arthur afastou-se para sair, mas voltou ainda dizendo-lhe:
-         Nada contes a Carol, desejo lhe fazer uma surpresa!
O servo reverenciou-o humildemente  e Arthur foi se embora.
Gabriel olhou a noite que descia bela sobre a propriedade, e jurou fidelidade absoluta a lorde Arthur e á sua família, admirando a grandiosa lua cheia que surgia no horizonte. Teria a oportunidade de reparar as falhas inadmissíveis que cometera em sua vida; reconstruir uma vida nova!


















                     O dia do casamento amanheceu extremamente luminoso. Poucos convidados haviam vindo ao castelo para a grande festa e estes estavam devidamente alojados em comodidade e regalias.
Alguns lordes passeavam com lorde Arthur, conhecendo-lhe a propriedade e fazendo-lhe elogios, o que o deixavam satisfeito.
Gabriel, discretamente tinha sido transferido, ainda de madrugada, para que ninguém o visse, da masmorra para um cômodo aposento. Neste deveria ficar oculto até á hora da cerimonia.
Sara e Carol mantinham-se em seus aposentos preparando-se para a grande comemoração, assim como as demais damas que haviam vindo da corte.
A cerimonia de casamento, seria realizada quando o sol declinasse a sua majestade, ao entardecer.
Lorde Arthur acompanhara Ricardo durante todo o dia. Este se mantivera intranqüilo e ansioso continuamente ; por vezes o jovem brincava com ele, em seu espirito juvenil, fazendo gracejos a respeito de sua enorme inquietude e de sua expectativa ; o medico mostrava-se aparentemente contrariado e chateado mas em seu intimo gostava da alegria, que aquele jovem, que lhe era como um filho, lhe passava.
Lorde Arthur não contara ao medico sobre a presença de Gabriel no interior do castelo e nem de suas intenções  em presentear Carol com sua presença. Seria lhe uma enorme surpresa, ver que aquele jovem nobre, aceitara seus conselhos, e que a misericórdia e a benevolência haviam curado as inúmeras dores de seu coração.
Aproximando-se das quatro horas, ao entardecer de um dia interminável, os músicos fizeram soar lindas valsas no salão nobre.
 Em muito requinte e luxo os convidados pouco a pouco iam sendo anunciados por um servo elegantemente uniformizado, entrando no salão em elegantes trajes de gala.
As velas em chamas que luziam nos candelabros faziam brilhar os pingentes de cristalinos, realçando uma bela claridade.
Belas jovens de varias faixas etárias, rodopiavam com seus avolumados vestidos agora no salão, em compasso ameno com seus parceiros de dança.
O nobre Arthur olhava-as encantado com tanta beleza e formosura, mas sem nenhum interesse especial.
Repentinamente o servo anunciou uma convidada, o que despertou a atenção de todos convidados, para a entrada do salão.
-         A Duquesa Linia de Corleanos!
Os murmúrio se fez entre os convidados. Todos desejavam conhecer quem era  e como era a irmã daquele lorde tão jovem e tão rico.
Linia entrou imponente no salão; estava lindíssima em trajes de veludo acetinado em tons lilases; Sorriu a Arthur fazendo-lhe leve meneio.
O lorde Arthur sentindo-se observado por todos os seus convidados, sorriu-lhe amorosamente, beijando-lhe as mãos.
Depois no entanto, não conseguindo conter-se, murmurou-lhe num cochicho irônico e brincalhão, de maneira que somente ela ouvisse:
-         Linia estou surpreendido, os ares dos campos te fizeram imenso bem; estás maravilhosa!
Linia agradeceu-lhe sorridente, ainda que soubesse que o irmão lhe era irônico; e entrou no salão sendo cumprimentada por todos.
E assim, diversos convidados continuaram sendo apresentados ao chegarem no salão nobre.
O frei também já havia chegado e aguardava próximo a um pequeno altar improvisado e completamente adornado por lírios brancos.
Ricardo aproximou-se do salão e Lorde Arthur  fez um  sutil meneio ao servo, para que este também o anunciasse:
-         Lord  Ricardo Lamartine!
Ricardo olhou-o com discreta censura, pelo constrangimento, mas radiante em felicidade sorriu-lhe caminhando para o pequeno altar onde aguardaria a noiva.
As valsas haviam sido interrompidas; uma bela melodia suave orquestrada pelos músicos, se misturava ao murmúrio dos convidados alegres no salão. O ambiente era leve e feliz.
Derrepente o servo anunciou:
-         Lorde Gabriel Vandak! Filho do falecido Duque Vandak!
Imediatamente os olhos de Arthur e Ricardo se encontraram num forte e indescritível abraço apertado.
Apesar da distancia que os separava no salão, o nobre jovem Arthur  sentindo uma enorme emoção de amor em seu peito; podia observar que os olhos  de um grande homem, seu mentor Ricardo; lacrimejavam destemidos á presença dos convidados ou ás normas sociais; em sinceras lagrimas, puras e belas, que lhe sorriam em pranto candidamente agradecido...Lagrimas que o aplaudiam com extraordinário orgulho!
Gabriel entrou belíssimo e elegante no salão; acompanhado de um jovem forte também elegantemente vestido.
Linia não conseguia conter-se de curiosidade, indagando-se: "Não era aquele homem que havia sido preso na masmorra?"..."Que fazia numa festa tão imponente"...Admirou-lhe o corpo forte e musculoso e o semblante em traços bonitos. Sentia enorme ânsia de aproximar-se para vê-lo melhor, pois alguns cavalheiros impossibilitavam-lhe visão plena, mas ficou onde estava.
Lorde Arthur tentando se controlar na profunda emoção que ainda sentia na vontade enorme de correr e abraçar, aquele que lhe era o pai Ricardo; Sorriu fraternalmente para Gabriel cumprimentando-o .Grandes e nobres sentimentos se expandiam em seu pequeno coração.
-         Duquesa Sara de Corleanos!
Sara entrou imensamente sorridente no salão. O seu cabelo adornado num primoroso coque, a fazia aparentar faixa etária mais adulta. Estava elegantemente vestida, com um deslumbrante vestido em cetim branco com muitas rendas e  esvoaçante em saias rodadas que pareciam flutuar com seu caminhar; apertado em sua cintura, oferecendo-lhe as  curvas que aquele corpo   ainda muito jovem não  possuía. Os pequeninos seios eram subtilmente disfarçados, propositadamente, por um xale de renda que lhe descia sobre os ombros .
Lorde Arthur olhava-a fascinado com sua beleza e caminhou determinado até ela. Deu-lhe um beijo carinhoso em suas mãos, e Sara sorriu-lhe agradecendo num meneio. Disse-lhe:
-         Querido Arthur, dançarás todas as valsas comigo!
Arthur prontamente concordou sorrindo-lhe ; Sara então, soltando as suas mãos que o jovem ainda segurava firmemente, caminhou até próximo ao seu tutor Ricardo. Percebera a presença de sua mãe Linia, mas a ignorara.
O nobre jovem, olhava Sara continuamente, sendo-lhe difícil manter-se distante.
Finalmente o servo anunciou:
-         Duquesa Carol Vandak!
Arthur sentiu receoso que os convidados ali presentes. Pareciam confusos com aquela duquesa tão desconhecida na corte; porem tranqüilizou-se ciente de que estes não se atreveriam a questionar ou dar seqüência a comentários maldosos.
Carol aparentemente emocionada, olhou Arthur forçando um sorriso, mas o seu semblante em verdade, ameaçava prantear felicidade.
Arthur aproximou-se e brincando murmurou-lhe carinhosamente:
-         Sei que é o dia mais feliz de tua vida, e a tua enorme beleza e candura demonstram a tua felicidade; porem deixa para chorar depois!
A brincadeira infantil de Arthur a descontraíra um pouco. Carol  lhe sorriu ternamente.
Arthur fez um sinal aos músicos para que tocassem uma outra doce melodia; Era o sinal combinado com Gabriel para que se aproximasse de Carol.
O jovem Arthur, sentindo enorme e sincera emoção disse á nobre senhora, num sussurro baixinho:
-         O meu presente de amor, para uma mãe tão querida...
E apresentou-lhe seu filho Gabriel, que já se aproximara.
-         ...eis o teu filho Lorde Gabriel Vandak, que te levará ao altar!
Carol não conseguiu conter-se na imensa emoção que sentia ao ver Gabriel ali; indiferente ás pessoas ali presentes  abraçou Arthur fortemente deixando se entregar a um pranto profundamente agradecido.
A vida finalmente lhe era plenamente feliz, aos quarenta e dois anos de existência.
Arthur  extremamente emocionado com aquele momento sublime de amor; Também pranteou expontânea felicidade.
Inúmeros convidados ali presentes, atônitos, não compreendiam aqueles momentos tão emotivos que presenciavam. Mantinham-se silenciosos observando-os surpresos.
O jovem contendo-se no pranto sutil, sorriu-lhe brincando:
-         Disse-te para chorares depois; tinhas que fazer-me chorar! Vai querida Carol todos te esperam; é a tua grande noite e tudo mereces!
A nobre senhora tentando também conter a grande emoção, que sentia forte em seu peito; deu a mão a Gabriel.  Este segurando-a com certa  energia tremula, levou-a ao altar, sob os olhares de todos.
As duas mãos unidas estavam úmidas e tremulas.  Carol sentia que o seu filho, estava tão sensibilizado quanto ela.
Chegando ao altar Gabriel deixou a sua mãe próxima ao Lorde Ricardo. Este sorriu-lhe agradecido, e beijou a face de sua companheira Carol, com enorme amor, dando-lhe a mão, para que fosse abençoada aquela união .
A cerimonia foi breve mas profundamente emotiva.  As valsas recomeçaram no salão convidando os ali presentes a se divertirem.
-         Vamos dançar Arthur?
Os olhos de Sara pareciam mergulhar no seu coração. Lorde Arthur sentindo-se culpado pelo amor que  tinha a sua sobrinha, ainda tão jovem; olhou para  Ricardo suplicante, sem saber como agir. Este, sentindo-lhe os receios, murmurou-lhe num silencioso cochicho, confortando-o em suas aflições:
-         Poderás dançar e conversar com Sara a noite inteira se assim desejares! Não vejo problemas nisto!
Arthur sentindo-se aliviado, tirou Sara gentilmente para dançar. Também o lorde Ricardo e a duquesa Carol foram dançar no salão radiantes de alegria.
Linia não conseguia mais controlar-se e aproximou-se de Gabriel dizendo-lhe subtilmente para que ninguém lhe percebesse a indelicadeza:
-         Queres dançar comigo?
Gabriel olhou a bela jovem que lhe sorria amavelmente, olhou o guerreiro Paulo que o olhava subtilmente... sentindo-se confuso em como deveria agir, balbuciou-lhe educadamente aquela linda jovem:
-         Não sei dançar senhorita, perdoai-me!
Linia  intrigada e sentindo-se confusa com o estranho sentimento que a impulsionava a não afastar-se dele, insistiu:
-         Conversai comigo então, Senhor Lorde Gabriel!
Este novamente olhou para Paulo, sem saber como se comportar...pensou; "estaria infringindo as regras de lorde Arthur, em convidar uma senhorita para conversar?"...
Paulo percebendo-lhe as duvidas, fez um sinal discreto para que um servo chamasse o lorde Arthur, que ainda dançava uma valsa com Sara.
O nobre jovem pedindo desculpas por interromper a alegre dança, afastou-se da jovem sempre compreensiva,  caminhando na direção de Gabriel.
-         Algum problema Gabriel?
Indagou-lhe Arthur sorridente pois muitos convidados os observavam; fixou no entanto o seu olhar em sua irmã Linia, murmurando-lhe num baixo balbucio sempre sorridente.
-         Deixastes as noções de etiqueta em tua propriedade? Não sabes que uma dama jamais deverá abordar um cavalheiro?
Linia contrariada e sentindo-se humilhada na frente daqueles cavalheiros afastou-se. Gabriel sentindo-se  temeroso com aquela situação que ali se criara, pediu-lhe:
-         Senhor Lorde Arthur, perdoai-me mas não estou certo em como comportar-me aqui...não seria melhor que eu retornasse ao aposento?
Arthur finalmente convencia-se de que Gabriel havia perdido por certo sua memória; em sua simplicidade e completa indiferença a Linia que tanto se parecia, com sua paixão Brigith.
Olhou o salão ao redor e visualizou que Sara o aguardava ansiosa, desejando dançar.
-         Gabriel, deverás comportar-te como qualquer convidado! Poderás dançar, conversar, comer ou beber...no entanto estás proibido de te retirares deste salão enquanto eu não o autorize; compreendes?
Gabriel fez-lhe um meneio afirmativo agradecendo-lhe o auxilio.
-         Paulo escutastes minhas ordens?
O guerreiro que vigiava Gabriel respondeu a seu nobre senhor:
-         Sim senhor lorde Arthur, assim será!
Finalmente Arthur sentia-se novamente livre, a divertir-se com Sara, em noite tão feliz.
Gabriel também tentou distrair-se. Olhava as danças com euforia e escutava as valsas alegres, sempre olhando para a sua mãe Carol que aparentemente muito feliz conversava animadamente com seu companheiro Ricardo.
Admirou as bonitas jovens no salão, mas não teve o atrevimento de convida-las a dançar; ainda que sentisse enorme vontade de faze-lo.
Sentia-se leve. Sentia-se bem! Contemplou o Lorde Arthur com verdadeira adoração e agradecimento; Paulo sempre a seu lado subtilmente, parecia-lhe o amigo e ninguém desconfiava a sua função de guarda.
Linia que havia se afastado contrariada, com a observação do irmão, não conseguia controlar-se e continuamente observava Gabriel. Estava fascinada por seu porte elegante, os traços belos do seu rosto, a vivacidade dos seus olhos, a cor bronzeada da sua pele...sentia-se atraída por seus músculos aparentes sob as vestes...estava incrivelmente seduzida por aquele homem!
Arthur percebera isto preocupado. Era incessante o seu olhar para Gabriel. Aproximou-se fazendo-lhe uma reverencia.
-         Duquesa Linia, deseja dançar com seu irmão?
Linia olhou-o ainda contrariada mas percebendo-se observada por alguns convidados, deu-lhe a mão sorridente e ambos saíram valsando.
Arthur que o havia feito propositadamente para falar-lhe sem atrair atenções,            murmurou-lhe em seu ouvido discretamente:
-         Ficai longe de Gabriel, minha irmã Linia!
A jovem tentando fingir-se surpresa, respondeu-lhe também num murmúrio respondeu-lhe:
-         Não compreendo o que dizes, meu irmão?
Arthur aproveitando-se da valsa, deu um rodopio apertando-a em advertência.
-         Sabes sim irmãzinha...observo-te desde o inicio da cerimonia e percebi claramente como te aproximastes dele; e como ele reagiu em total indiferença...tirai o olhar de Gabriel! Se desejas casar-te novamente, poderás conseguir um bom pretendente neste salão...Gabriel é mais pobre e servil que teu falecido marido Job, compreendestes?
Dizendo-lhe isto, Arthur interrompeu a dança da valsa, despedindo-se dela cordialmente num sorriso.  Caminhou então mais tranqüilo e alegre, para conversar um pouco com seus amigos, Carol e Ricardo.
-         Arthur, poderei conversar com meu filho Gabriel?
Pediu-lhe Carol humildemente, ainda emocionada com tudo e imensamente agradecida. Arthur pegando-lhe a mão falou-lhe carinhosamente:
-         Minha querida Carol, disse-te que era o meu presente de padrinho...aceitei os bons conselhos de  teu companheiro Ricardo e Gabriel está livre, porem sob vigilância rigorosa!
A nobre senhora então, compreendeu o homem robusto que lhe fazia companhia, como se um grande amigo lhe fosse.
-         Poderá ir e vir ! Morará em vossa propriedade, enquanto residirem aqui no castelo; Trabalhará administrando-a para vós...
-         Existe tanta bondade em seu coração meu nobre Arthur, eterna será a minha gratidão para contigo!
-         Carol deixai de agradecimentos, muito lhe devo ainda, em nome de minha família...
Carol então, sorrindo-lhes,  pediu-lhes licença e foi falar com seu filho Gabriel.
-         Estás tão elegante, meu filho!
Gabriel beijou-lhe as mãos carinhosamente imensamente emocionado.
-         Nunca te esqueças Gabriel, do que o nobre Arthur está fazendo por ti, concedendo-te a liberdade...lhe deves gratidão e fidelidade eterna!
Carol deu uma pausa fixando-lhe o olhar atentamente.
-         Promete a esta tua mãe, nesta noite tão linda e tão feliz, que reconstruirás a tua vida sendo um homem bom e justo!
Gabriel olhou-a serenamente e as lagrimas sensibilizadas desceram-lhe nos olhos, falando-lhe ternamente:
-         Minha mãe, eu lhe prometo que de hoje em diante, somente sentirás orgulho deste teu filho!
A emoção comovia-os enormemente e depois de breve silencio, Gabriel sussurrou-lhe:
-         Minha mãe, sinto imensa vontade de dançar, estou tão feliz!
Carol sorriu-lhe , falando-lhe.
-         Dançai comigo a próxima valsa!
Recomeçando uma nova valsa, Gabriel tirou a mãe gentilmente para dançar, sob a continua vigilância de Paulo.
Começaram a rodopiar no salão e Gabriel foi se sentindo cada vez mais leve e mais feliz.








































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